sexta-feira, 22 de junho de 2012

Contra o descaso

Diante do caos na saúde pública potiguar, principalmente no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel (HWG), o Conselho Regional de Medicina do RN (Cremern) decidiu tomar uma medida inédita no país: ajuizar uma ação civil pública contra o Governo do RN em virtude da maior crise na história do HWG. Na ação coletiva pioneira que corre na 4ª Vara da Justiça Federal, o conselho solicita que o estado indenize em R$ 1 milhão seus cidadãos em um processo por Dano Moral Coletivo. Caso seja concedida, a quantia será destinada a um fundo de saúde a ser escolhido.

A ação do Cremern pede, ainda, que sejam providenciados leitos para o setor de Politrauma ( a porta de entrada do HWG), condições de atendimento digno no Centro de Recuperação de Operados (CRO) e melhorias no setor de necrotério. Em caso de descumprimento das solicitações, o conselho pede que seja aplicada uma multa diária de R$ 20 mil para a pessoa da governadora Rosalba Ciarlini.

As justificativas da medida foram apresentadas aos jornalistas pelo presidente do Cremern, Jeancarlo Cavalcante, juntamente com um vídeo com cenas fortes e nunca divulgadas à imprensa sobre o submundo do HWG. No vídeo, que vai desde o início do atendimento no hospital na sala Politrauma até o necrotério, situações subumanas de atendimento à população são registradas por um médico do hospital. O vídeo consta no processo protocolado na última segunda-feira.

As imagens mostram a superlotação dos setores e corredores do HWG, pacientes de enfermaria e de UTI se misturando em macas e no chão do hospital devido à ausência de leitos, além da copa do hospital, que tem contato direto com o corredor do setor Politrauma.

Os pontos de maior impacto do vídeo são as imagens do CRO e do necrotério, locais que a imprensa não tem acesso no HWG. O vídeo registra o CRO atuando com o dobro da sua capacidade, com pacientes graves internados e suas camas e macas sem o devido espaço entre elas, dificultando o controle de infecções de alto risco. Além disso, é mostrado ocompartilhamento de equipamentos na sala, onde um monitor registra a pressão arterial três doentes, induzindo o médico ao erro por não saber de qual paciente é cada registro.


Presidente do conselho, Jeancarlo Cavalcante mostrou vídeo com cenas nunca divulgadas do HWG. Foto: Fábio Cortez/DN/D.A Press
No setor de necrotério, são vistas geladeiras quebradas ou sem trava e cadáveres em decomposição sem o devido encaminhamento, estando um deles "esquecido" a quatro dias na sala. "Um governo que não cuida dos vivos, também não cuida de seus mortos. O paciente não tem dignidade nem após a morte no Walfredo Gurgel", diz o presidente do Cremern, Jeancarlo Cavalcante.

Segundo o conselho, já existem oito ação na Justiça Estadual que solicita condições básicas para prover um atendimento de qualidade no HWG e a decisão do Cremern de ser titular em um ação na Justiça Federal se mostrou necessária para que o governo reconheça que a situação de seu maior hospital público está insustentável, explica Jeancarlo Cavalcante.

A nova postura mais enérgica do Cremern é apoiada pela Ordem dos Advogados (OAB) e Ministério Público Estadual (MPE). A promotora da Saúde, Kalina Filgueira, disse por meio da assessoria que o MP vê com bons olhos toda e qualquer iniciativa em prol da população. Já a representante da OAB, Elke Mendes Cunha, foi mais enfática ao expressar não só o apoio dos advogados à decisão do conselho, mas também que a OAB defende que há uma situação de calamidade pública na saúde do RN, não só no Walfredo Gurgel. "A realidade atual do HWG é apenas uma consequência e um retrato agravado da saúde pública estadual", diz ela.

intervenção

A assessoria do Ministério Público Federal informou que o processo deve ser encaminhado pelo Cremern à entidade e, a partir de então, um promotor a ser sorteado analisará o caso e ofertará o parecer favorável ou não à ação. Questionado se uma intervenção ética no HWG está em questão, seguindo a decisão do conselho dos médicos que interditou há 40 dias o setor de reanimação do hospital, o presidente do Cremern, Jeancarlo Cavalcante, disse não descartar a possibilidade.

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