Em apenas quatro meses, o Ministério da Justiça anulou 133 anistias
políticas concedidas a ex-cabos da Força Aérea Brasileira (FAB),
desligados durante a ditadura militar (1964-1985). Ao todo, o grupo de
trabalho interministerial criado para verificar se, de fato, os
ex-praças licenciados foram alvo de perseguição política, deverá
revisar 2.574 processos.
O atual processo de revisão dos
benefícios concedidos desde 2001 pela Comissão Nacional de Anistia,
ligada ao ministério, começou em 16 de fevereiro de 2011, com a
publicação da Portaria Interministerial nº 134. O texto é assinado pelo
ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e pelo então advogado-geral
da União substituto, Fernando Luiz Albuquerque Faria.

Ministério da Justiça já anulou 133 anistias políticas concedidas a ex-cabos da FAB
Perguntado
pela Agência Brasil sobre por que a revisão não é feita pela própria
Comissão de Anistia, o Ministério da Justiça respondeu que o objetivo é
dar imparcialidade ao processo. A reportagem tentou, sem sucesso, ouvir
a opinião do presidente da comissão, o secretário nacional de Justiça,
Paulo Abrão Júnior.
Dos 154 processos já analisados, em apenas
três casos o status de anistiado foi mantido. Dezoito processos
acabaram sendo excluídos da revisão por não se enquadrarem nos
objetivos do grupo de trabalho, criado para tratar exclusivamente dos
efeitos da Portaria nº 1.104 GM3, de outubro de 1964.
Considerada
pelo plenário da Comissão de Anistia como um "ato de exceção de
natureza política" que visava a "renovar a corporação como estratégia
militar, evitando que a homogênea mobilização de cabos eclodisse em
movimentos considerados subversivos", conforme documento do Tribunal de
Contas da União (TCU), a portaria do Ministério da Aeronáutica limitou
a permanência dos cabos na ativa ao máximo de oito anos ininterruptos.
Ao fim desse prazo, os que não haviam alcançado outra graduação
passaram a ser automaticamente desligados, sem direito à remuneração.
Até
a publicação da norma, aqueles que atingiam oito anos de serviço podiam
pedir sucessivos reengajamentos. Embora não fosse um direito adquirido,
a prática atendia às necessidades de mão de obra especializada da
própria FAB. E o praça, por sua vez, conquistava estabilidade
empregatícia quando completava dez anos de serviço, podendo progredir
na carreira militar.
Em 2003, ao responder à consulta feita pelo
Ministério da Justiça, a Advocacia-Geral da União (AGU) concluiu que a
Portaria nº 1.104 "não configura, genericamente, um ato de exceção",
especialmente para os militares que ingressaram na FAB após a sua
edição, "devendo a motivação exclusivamente política do desligamento
ser verificada pela análise de cada caso".
Mesmo assim, para o
presidente da Associação dos Anistiados e Anistiandos do Nordeste
(Asane), Marcos Sena, a publicação da portaria foi uma "retaliação
tardia" à participação de alguns então militares em movimentos
reivindicatórios que aconteceram antes do golpe de março de 1964.
Principalmente por ter sido usada para justificar o desligamento de
pessoas que haviam ingressado na FAB antes mesmo de a norma ter sido
publicada, abortando a carreira de milhares de praças que, segundo
Sena, não tiveram direito à defesa. De acordo com ele, é o caso dos 495
ex-cabos cuja anistia foi revogada em 2004 por uma portaria do então
ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, sob a justificativa de que
os ex-militares não podiam alegar terem sido prejudicados por uma norma
que já estava em vigor quando ingressaram na força.
Desde a
última terça-feira (12), a reportagem aguarda a resposta do Comando da
Aeronáutica sobre o quanto a União deverá economizar com a suspensão do
pagamento dos benefícios aos 133 anistiados cujos processos já foram
anulados. No passado, a FAB chegou a dizer que a Portaria nº 1.104 teve
mero caráter administrativo.
Já o Ministério da Defesa, por meio
de sua assessoria, limitou-se a dizer que cumprirá as decisões do grupo
interministerial, sem comentar as razões do processo de revisão. No
Ministério da Justiça, além do presidente da Comissão Nacional de
Anistia, Paulo Abrão, a Agência Brasil também não teve resposta para o
pedido de entrevista com Rayanna Lemes Werneck Rodrigues, servidora do
gabinete do ministro que preside os trabalhos do grupo interministerial.
* Fonte: Agência Brasil