segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

"Festa só depois do estado de calamidade"


Na próxima quinta-feira será encerrado o  prazo para os novos prefeitos entregarem relatório ao Tribunal de Contas do Estado apontando detalhes sobre como encontraram as administrações. Para o procurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, Luciano Ramos, a resolução que determina aos novos prefeitos entregarem o relatório ao TCE é uma medida para evitar que a Corte adote as providências contra os maus gestores em um tempo mais demorado. "Para que a situação não seja projetada para o futuro, foi fixado o 31 de janeiro para emitir relatório dando exata definição para a situação encontrada pelo atual gestor. Com isso, o TCE poderá buscar os antigos gestores que não se portaram como deveriam", explica o procurador. Aos novos gestores ele alerta: a recomendação do MP sobre os gastos com as festas de carnaval, é aplicável também a todas as promoções realizadas pelo município. Para o procurador-geral, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado ao recomendar aos prefeitos priorizar os gastos com as necessidades que ensejam os decretos de calamidade, está já apontando o norte das fiscalizações que serão feitas. Sobre a tomada de contas especial que será feita na Prefeitura do Natal, a inspeção nos contratos do instituto Marca e os decretos de calamidade das prefeituras, o procurador-geral junto ao Tribunal de Contas do Estado, Luciano Ramos, concedeu a seguinte entrevista:

O que esperar da inspeção que será feita nos contratos da empresa Marca com a Prefeitura do Natal?

A inspeção foi definida pela Segunda Câmara. A partir de uma operação do Ministério Público Estadual, que foi denominada Operação Assepsia, houve uma intervenção nas gestões de UPAS e AMEs. Essa intervenção que se concluiu em dezembro detectou  uma série de serviços prestados por um valor muito alto e que conseguiu ser realizado por um valor muito inferior a este, que até então vinha sendo praticado. É algo superior a R$ 1,5 milhão por mês a menos nos contratos. São valores bem significativos. E o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado considerou pertinente analisar se esses valores pagos até a intervenção devem ter a devolução do erário. Por isso, a necessidade de inspeção. Havendo informações de outras tantas irregularidades poderá ser ampliada a investigação.

A Associação Marca também fez contrato com o Governo do Estado, com a administração do Hospital da Mulher. Como o Ministério Público atuará?

Em relação ao Hospital da Mulher, a própria Secretaria Estadual de Saúde verificou a partir das implicações de uma mesma contratada pelo Município de Natal e pelo Estado fazer uma auditoria e verificar se os problemas detectados na gestão em Natal não se refletiam na gestão do Hospital da Mulher em Mossoró. Esse relatório foi concluído, mas ainda não encaminhado ao Ministério Público junto ao TCE. Como há percepção de que o controle interno feito pela Secretaria Estadual de Saúde e o controle externo feito pelo Ministério Público junto ao TCE caminham de maneira a trocar informações, ter parceria profícua, acredito que esse relatório chegará em breve ao Tribunal de Contas e será feito um procedimento específico quanto ao Hospital da Mulher em virtude das mesmas implicações e dos resultados encontrados pela auditoria. 

O senhor hoje tem uma conclusão sobre os contratos de terceirização para administração de unidades de saúde, como ocorreu na Prefeitura de Natal e no Governo do Estado?

Em relação aos contratos de terceirização há dois aspectos que nós precisamos analisar. Uma coisa é conduzir toda gestão de uma unidade hospitalar, de uma unidade de saúde em geral, por uma entidade contratada. Essa situação, inclusive, os tribunais superiores tem resistido a esse aspecto, principalmente com essas instituições contratando atividade-fim, como médicos, enfermeiros.  O nosso caminho, o do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, é verificar que este modelo não se adequa ao ordenamento. Além disso, a própria seleção dessas entidades que estão fazendo isso deverá se adequar a lei das licitações. Ou seja, deverá haver um controle mais rigoroso quanto a seleção dessas organizações, dessas entidades. Esse é um dos aspectos. Porém há também uma tendência de contratar cooperativas. Não é só a gestão das unidades como tem sido feito, também tem problema quanto há cooperativas. Inclusive há uma decisão recente da Justiça Federal do Rio Grande do Norte especificamente quanto a uma cooperativa, limitando a abrangência dessa cooperativa, no caso dos anestesiologistas, em relação ao Estado para não incorporar todos os profissionais dentro dessa mesma cooperativa e o Estado não ter outra opção de contratação se não esta. Também o Ministério Público junto ao TCE vê com dificuldade essa situação. Até o próprio Tribunal de Contas da União também já teve entendimento nesse sentido. As terceirizadas devem não serem contratadas diretamente. Cabe ao Poder Público contratar os estabelecimentos quando faz convênio em relação ao SUS. Os estabelecimentos que estão previstos na lei deverão ficar responsáveis pela contratação dessas cooperativas. E não diretamente como tem sido feito hoje quer seja convênio com o SUS ou quer seja, e aí é uma situação ainda mais grave, suprir carga horária dos servidores efetivos.

O Ministério Público propôs e o TCE deferiu pedido de tomada de contas especial na Prefeitura de Natal nos últimos quatro anos. É viável fazer uma tomada de contas com uma dimensão temporal como essa? O que esperar desse trabalho?

Essa foi uma provocação feita pelo procurador Carlos Roberto e acatado pela Segunda Câmara de contas, que é responsável pela Prefeitura de Natal, que considerou uma multiplicidade de fatos que enseja atenção especial quanto a esta gestão. Evidentemente para analisar esse período de quatro anos é preciso estabelecer prioridades que serão objeto desta verificação. Tive uma reunião com o controlador geral Fábio Sarinho e também com o procurador (geral do Município) Carlos Castim para que possamos alinhar o cronograma da tomada de contas especial. Eles estão receptivos a importância da tomada de contas especial e haverá a verificação do que já é objeto de análise do Tribunal de Contas, como a Operação Assepsia, os precatórios da Henasa. Nós precisamos que o controle interno volte sua atenção para outros contratos que tenham a perspectiva de que foram objeto de alguma irregularidade. Há diversas notícias, há diversos fatos, mas precisamos traçar a prioridade.

Qual o prazo que a Controladoria do Município terá para esse trabalho?

Essa proposta deverá vir do controle interno. O que o Tribunal de Contas fez foi afirmar que há necessidade de se fazer tomada de contas especial com uma especificação dos atos. Porém, na decisão não foi estabelecido prazo fechado para conclusão. Nesse contato que tive com o controlador fiz referência que ele indique para o Tribunal, de acordo com a realidade interna dele (da Controladoria Geral do Município), qual o cronograma que pode estabelecer para, já em relação ao relator, se estabelecer o prazo. Acredito que no mínimo 30 dias seja necessário para ter os primeiros resultados.

O Ministério Público junto ao TCE fez uma recomendação para as prefeituras evitarem gastos com o carnaval. O que o MP pretende com essa recomendação?

É importante a compreensão de qual o papel do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado e junto aos gestores e dos envolvidos nessa situação. O Ministério Público junto ao TCE é responsável por fiscalizar os gastos com essas despesas. Ele não é responsável por autorizar ou desautorizar a realização de gastos. Porém, como ele vai fazer o controle dos gastos? Logo o Ministério Público está dizendo os parâmetros de fiscalização. E de maneira clara o MP/TCE não considera razoável que em um momento de calamidade pública haja gastos com festejos quer seja carnaval ou qualquer outra festa em geral em detrimento da situação de calamidade, que deve ser combatida como prioridade. Na medida em que se verifique gasto com essas festas em que não há justificativa nem quanto ao retorno financeiro para o município, a Prefeitura está simplesmente dando prioridade a algo que não terá contrapartida de retorno financeiro, e com prejuízo para o combate a seca, então dentro da ótica do MP não é razoável. Portanto é irregular feito nesse contexto. Agora isso não quer dizer que alguns municípios não tenham uma realidade própria que consigam fazer essa festa sem comprometimento do combate à seca. Tudo é questão de comprovação de que isso é possível.

O carnaval é apenas uma das festas. Mas as prefeituras também dispensam recursos para diversos outros eventos de shows...

A mesma lógica vale para todos os festejos. Essa recomendação não é nova para o Tribunal de Contas do Estado. Desde junho de 2012 temos a recomendação de que enquanto permanecer o estado de calamidade não deve haver gastos com festas em geral, padroeira, São João. Enquanto permanecer o estado de calamidade, e foi renovado e está em vigor, deve haver a contenção. Quando um determinado ente municipal se encontra em estado de calamidade e um lado tem bônus por essa situação, o governo federal tem uma série de políticas que dizem respeito a essa situação, como Bolsa Safra, auxílio para estiagem, que acaba compensando a situação de calamidade. Mas há ônus. Em relação a essa situação não é razoável direcionar recursos para suprir necessidade que não é primordial como o carnaval ou qualquer outra festividade.

Muitos prefeitos potiguares optaram por decretar estado de emergência ou calamidade logo no início da gestão. Não estaria ocorrendo exagero dos novos prefeitos no uso desse instrumento?

Especificamente quanto a exagero generalizadamente ainda o Ministério Público não verificou esta situação, mas há uma cautela do MP. Como há ônus e bônus há precipitação para se considerar o decreto tão somente visando o bônus que se terá com isso. Imaginar que, como se está em estado de emergência, flexibilizar a lei de licitações e muitas vezes essa situação prepondera em relação a outras conseqüências. O fato é que nossa cautela é não só analisar o decreto de emergência, mas todas as conseqüências dele. Inclusive dispensas de licitação oriundas do decreto de emergência não tem pertinência para a causa que gerou o decreto.

O Tribunal de Contas do Estado mantém o prazo de 31 de janeiro para os novos prefeitos entregarem relatório sobre como encontraram as gestões?

O Tribunal de Contas já no período de transição (das gestões) teve preocupação de fazer resolução observando como os novos gestores deveriam se portar diante da realidade administrativa que encontraram. Em muitas oportunidades os gestores que sucediam não encontravam documentos e elementos de despesa. Para que a situação não seja projetada paro futuro foi fixado o 31 de janeiro para emitir relatório dando exata definição para a situação encontrada pelo atual gestor. Com isso, o TCE poderá buscar os antigos gestores que não se portaram como deveriam.


Fonte: Tribuna Do Norte


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