Diante do caos na saúde pública potiguar, principalmente no Hospital
Monsenhor Walfredo Gurgel (HWG), o Conselho Regional de Medicina do RN
(Cremern) decidiu tomar uma medida inédita no país: ajuizar uma ação
civil pública contra o Governo do RN em virtude da maior crise na
história do HWG. Na ação coletiva pioneira que corre na 4ª Vara da
Justiça Federal, o conselho solicita que o estado indenize em R$ 1
milhão seus cidadãos em um processo por Dano Moral Coletivo. Caso seja
concedida, a quantia será destinada a um fundo de saúde a ser escolhido.
A ação do Cremern pede, ainda, que sejam providenciados leitos para o
setor de Politrauma ( a porta de entrada do HWG), condições de
atendimento digno no Centro de Recuperação de Operados (CRO) e
melhorias no setor de necrotério. Em caso de descumprimento das
solicitações, o conselho pede que seja aplicada uma multa diária de R$
20 mil para a pessoa da governadora Rosalba Ciarlini.
As
justificativas da medida foram apresentadas aos jornalistas pelo
presidente do Cremern, Jeancarlo Cavalcante, juntamente com um vídeo
com cenas fortes e nunca divulgadas à imprensa sobre o submundo do HWG.
No vídeo, que vai desde o início do atendimento no hospital na sala
Politrauma até o necrotério, situações subumanas de atendimento à
população são registradas por um médico do hospital. O vídeo consta no
processo protocolado na última segunda-feira.
As imagens
mostram a superlotação dos setores e corredores do HWG, pacientes de
enfermaria e de UTI se misturando em macas e no chão do hospital devido
à ausência de leitos, além da copa do hospital, que tem contato direto
com o corredor do setor Politrauma.
Os pontos de maior impacto
do vídeo são as imagens do CRO e do necrotério, locais que a imprensa
não tem acesso no HWG. O vídeo registra o CRO atuando com o dobro da
sua capacidade, com pacientes graves internados e suas camas e macas
sem o devido espaço entre elas, dificultando o controle de infecções de
alto risco. Além disso, é mostrado ocompartilhamento de equipamentos na
sala, onde um monitor registra a pressão arterial três doentes,
induzindo o médico ao erro por não saber de qual paciente é cada
registro.
Presidente do conselho, Jeancarlo Cavalcante mostrou vídeo com cenas nunca divulgadas do HWG. Foto: Fábio Cortez/DN/D.A Press |
No
setor de necrotério, são vistas geladeiras quebradas ou sem trava e
cadáveres em decomposição sem o devido encaminhamento, estando um deles
"esquecido" a quatro dias na sala. "Um governo que não cuida dos vivos,
também não cuida de seus mortos. O paciente não tem dignidade nem após
a morte no Walfredo Gurgel", diz o presidente do Cremern, Jeancarlo
Cavalcante.
Segundo o conselho, já existem oito ação na Justiça
Estadual que solicita condições básicas para prover um atendimento de
qualidade no HWG e a decisão do Cremern de ser titular em um ação na
Justiça Federal se mostrou necessária para que o governo reconheça que
a situação de seu maior hospital público está insustentável, explica
Jeancarlo Cavalcante.
A nova postura mais enérgica do Cremern
é apoiada pela Ordem dos Advogados (OAB) e Ministério Público Estadual
(MPE). A promotora da Saúde, Kalina Filgueira, disse por meio da
assessoria que o MP vê com bons olhos toda e qualquer iniciativa em
prol da população. Já a representante da OAB, Elke Mendes Cunha, foi
mais enfática ao expressar não só o apoio dos advogados à decisão do
conselho, mas também que a OAB defende que há uma situação de
calamidade pública na saúde do RN, não só no Walfredo Gurgel. "A
realidade atual do HWG é apenas uma consequência e um retrato agravado
da saúde pública estadual", diz ela.
intervenção
A
assessoria do Ministério Público Federal informou que o processo deve
ser encaminhado pelo Cremern à entidade e, a partir de então, um
promotor a ser sorteado analisará o caso e ofertará o parecer favorável
ou não à ação. Questionado se uma intervenção ética no HWG está em
questão, seguindo a decisão do conselho dos médicos que interditou há
40 dias o setor de reanimação do hospital, o presidente do Cremern,
Jeancarlo Cavalcante, disse não descartar a possibilidade.
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