Governadora e secretário são acusados de, dolosamente, não repassar orçamento integral dos poderes
A governadora Rosalba Ciarlini, do DEM, foi denunciada pela segunda
vez em menos de um mês pelo Ministério Público do RN por improbidade
administrativa. Desta vez, motivada pelo não repasse institucional do
duodécimo aos poderes e órgãos auxiliares (como o próprio MP), a
denúncia inclui também o secretário estadual de Planejamento e Finanças,
Obery Rodrigues. Em caso de condenação, Rosalba e Obery poderão perder
os cargos públicos que ocupam.
Isso, porque para o Ministério Público, ficou claro o desrespeito de
Rosalba e Obery às leis orçamentárias aprovadas em 2013 e em 2014. Neste
ano, a situação, conforme denúncia feita e entregue ao Tribunal de
Justiça nesta sexta-feira, foi ainda mais grave, uma vez que o Executivo
não se preocupou nem em publicar um decreto avisando sobre os cortes e
justificando, para isso, uma frustração – como fez no ano passado.
“Já no primeiro mês do exercício financeiro de 2014, sem qualquer
justificativa ou notícia de eventual frustração de arrecadação,
recusando-se explicitamente a se submeter às leis e sem a edição de
qualquer ato formal, a titular do Poder Executivo e o seu Secretário do
Planejamento e das Finanças, ora demandados, atingido o prazo
constitucional para a transferência dos duodécimos devidos a cada um dos
Poderes e Instituições (dia 20 de janeiro de 2014), repassaram ao Poder
Legislativo, ao Poder Judiciário, ao Ministério Público Estadual e ao
Tribunal de Contas do Estado somente os valores que quiseram e não
aqueles previstos na lei de regência (LOA 2014), sancionada pela própria
Rosalba Ciarlini Rosado”, afirmou o procurador geral de Justiça,
Rinaldo Reis, na denúncia enviada para a Justiça.
Diante disso, o Ministério Público do RN afirmou que é “inegável que a
ilegalidade de que se valeu a Governadora do Estado do Rio Grande do
Norte se reveste de acentuada gravidade no ordenamento jurídico
brasileiro, podendo implicar até mesmo no impedimento do governante,
dado o grau de reprovação jurídica dessa conduta”. Em seguida, citou:
“Artigo 10: São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária:
Infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei
orçamentária”.
Depois, a denúncia apontou que “no campo da ilicitude, da conduta
acima explicitada, a aventura despótica empreendida pela Governadora do
Estado do Rio Grande do Norte com o atuar decisivo do Secretário
Estadual do Planejamento e das Finanças apresentam-se, a toda evidência,
como relevantes o suficiente para configurar um ato de improbidade
administrativa e, até mesmo, na instância própria, um crime de
responsabilidade, de natureza político-administrativa”.
Por isso, no final da matéria, o MP pediu a “condenação da demandada
Rosalba Ciarlini e do demandado Obery Rodrigues nas sanções previstas no
artigo 12, inciso III, da Lei Federal n.º 8.429/92, inclusive nos ônus
sucumbenciais”. E, no artigo 12, inciso III, está escrito:
“independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas
na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade
sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou
cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: na hipótese do art.
11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública,
suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de
multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo
agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber
benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou
indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja
sócio majoritário, pelo prazo de três anos”.
OUTRA DENÚNCIA
No dia 25 de fevereiro, as promotorias de Infância e Juventude e a
Procuradoria Geral do Ministério Público do Rio Grande do Norte
encaminharam à Justiça, enviou denúncia de improbidade administrativa
contra a governadora Rosalba Ciarlini (DEM). Segundo o promotor Manoel
Onofre Neto, Coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias
de Defesa da Infância e da Juventude, a denúncia se dá em razão “da
situação caótica” em que se encontra a Fundação da Criança e do
Adolescente (Fundac) – órgão que administra os Centros Educacionais
(Ceducs) e Centros Integrados de Atendimento aos Adolescentes Acusados
de Atos Infracionais (Ciads) que acolhem os menores infratores.
“Embate orçamentário resulta no Judiciário rendido, MP acanhado, TCE enfraquecido e Legislativo humilhado”
Para o Ministério Público, não é por simples consequência de uma
eventual frustração de receita que o Executivo suspendeu cortou o
orçamento dos demais poderes e órgãos auxiliares. Ficou clara que houve
dolo. “Os demandados apropriaram, assim, ferindo a Constituição Federal e
as leis orçamentárias, recursos dos demais Poderes e Instituições em
favor do Executivo, com evidente prejuízo de ordem financeira para os
Poderes Legislativo e Judiciário, bem como para o Ministério Público e o
Tribunal de Contas do Estado”, afirmou Rinaldo Reis por meio da
denúncia.
“Infelizmente, o que se expôs está longe de poder ser encarado como
ato isolado ou mero desencontro entre os números trabalhados pela Chefe
do Poder Executivo e seu Secretário Estadual do Planejamento e das
Finanças e aqueles contidos na Lei Estadual n.º 9.826/2014, tratando-se,
antes, da reiteração de um comportamento acintosamente inconstitucional
e ilegal que desde o exercício financeiro de 2013 vem sendo praticado
pelos demandados Rosalba Ciarlini Rosado e Francisco Obery Rodrigues
Júnior e que, de uma vez por todas, não pode mais ser objeto de
complacência por tantos quantos tenham o mínimo de respeito pelos
postulados de um Estado de Direito como o nosso”, acrescentou.
Rinaldo Reis ainda afirmou que a consequência disso é o
enfraquecimento dos demais poderes que dependem do repasse
constitucional do duodécimo. “No caso em apreço, não se trata de uma
mera ilegalidade. Está em jogo a arquitetura e funcionamento das
instituições do Estado e a explícita vontade de sua gestora maior e de
seu secretário para as finanças públicas de submeter os demais Poderes e
Instituições às suas vontades, independentemente do conteúdo das leis. O
desenho que resultar do embate orçamentário proposto pelos demandados
Rosalba Ciarlini Rosado e Francisco Obery Rodrigues Júnior pode
significar um Poder Judiciário rendido, um Ministério Público acanhado,
um Tribunal de Contas enfraquecido e um Poder Legislativo humilhado”,
ressaltou.
“E mais. A partir do momento em que a governadora e o seu secretário,
chegado o dia 20 do mês de janeiro de 2014, retiveram/sonegaram, sem
nenhuma justificativa ou mesmo ato formal, parcela significativa do
duodécimo a que têm direito os demais Poderes, o Ministério Público e o
Tribunal de Contas, de acordo com a Lei Estadual n.º 9.826/2014,
acabaram por afetar, fortemente, a realização das despesas de custeio
indispensáveis à sua manutenção, prejudicando, sobremaneira, o
desempenho das atividades institucionais que lhes são imputadas pela
Constituição Federal”, criticou.
Governo não respondeu ao MP o porquê de não repassar o duodécimo integral, afirma procurador geral de Justiça
Na matéria, o Ministério Público fez uma extensa explanação,
fundamentada em números do Portal da Transparência (alimentado pelo
próprio Governo do Estado), para ressaltar a infração praticada pela
governadora e pelo secretário, ou seja, o não repasse integral do
duodécimo. “O dolo da governadora do Estado e do secretário estadual do
Planejamento e das Finanças de não cumprir a lei orçamentária é
evidente. Mediante consulta efetuada ao Sistema Integrado para
Administração Financeira do Governo do Estado do Rio Grande do Norte
(SIAF/RN), constatou-se que a programação financeira definida pelos
demandados para os Poderes e Instituições relativamente ao exercício de
2014 é inferior ao orçamento anual aprovado pela Assembleia
Legislativa”, analisou Rinaldo.
E não foi só. O Ministério Público também narrou toda a sequência de
fatos que levaram a aprovação da matéria orçamentária na Assembleia
Legislativa, o que ocorreu já no início deste ano. Vale lembrar que a
discussão dos valores do duodécimo foram discutidos, diretamente, com os
deputados e não sofreram qualquer veto por parte do Governo do Estado
após a aprovação. “Como se percebe, o duodécimo depositado para o
Parquet no mês de janeiro de 2014 foi calculado, indevidamente, com base
nos valores insertos na proposta orçamentária anual originalmente
enviada pela Chefe do Poder Executivo à Assembleia Legislativa (isto é,
com fulcro no texto preliminar do Projeto de Lei n.º 0139/2013),
ignorando completamente a quantia global (pós-emenda, portanto) ao final
aprovada pelo Parlamento, a qual, repita-se, foi objeto de sanção por
parte da própria Governadora do Estado do Rio Grande do Norte”, contou o
MP.
Além disso, o Ministério Público revelou que tentou explicações do
Executivo do porquê do repasse integral não está sendo feito. Contudo,
não recebeu qualquer resposta. O Governo, assim como fez no ano passado,
mesmo após o MP ganhar na Justiça o direito ao repasse integral do
duodécimo, não quis saber de diálogo. “Em vista do exposto, o
Procurador-Geral de Justiça Adjunto, Jovino Pereira da Costa Sobrinho,
endereçou ofício ao Secretário de Estado do Planejamento e das Finanças,
Francisco Obery Rodrigues Júnior, solicitando a complementação do
repasse concernente ao mês de janeiro de 2014, a fim de que o duodécimo
devido ao Órgão Ministerial fosse recomposto na sua totalidade.
Decorrido quase um mês do recebimento da comunicação administrativa, e
sem que nenhuma resposta ou providência concreta tenha sido adotada por
parte da Chefe do Poder Executivo e do Secretário Estadual da SEPLAN no
sentido de restabelecer o montante a que legalmente faz jus o Ministério
Público Estadual, o Parquet buscou amparo no Poder Judiciário,
impetrando Mandado de Segurança n.º 2014.002637-5 junto ao Tribunal de
Justiça do Estado do Rio Grande do Norte”, narrou.
Diante do silêncio, o MP foi atrás de suas mesmas explicações e
afirmou, na denúncia, que “não é de hoje que a governadora e o seu
secretário do Planejamento e das Finanças tratam com uma visão de
economia doméstica os recursos que são institucionais, cuja previsão e
destinação submetem-se ao princípio da legalidade, fundamento do Estado
de Direito”. Em seguida, citou uma matéria jornalística publicada em
2013, com Rosalba, onde ela comparou a reclamação dos poderes pelo corte
no orçamento à “reação é a mesma quando os filhos não recebem a mesada
completa”.